segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Dançando de encontro à criança interior...

“Quem sabe falar sabe cantar, quem sabe andar sabe dançar”, disseram os antigos.


No alvorecer da civilização, nasceu a dança. De roda, redonda como o mundo. Espontânea como as crianças que, mais próximo da origem, talvez ainda guardem a razão por que todos os povos dançam em roda.

Por que? Pergunte às crianças, que talvez dirão: para brincar, mais nada...

Nada? Tudo! O círculo da dança fala que na vida tudo é cíclico, tudo é conectado, tudo começa, amadurece e finda... tudo recomeça de um outro jeito no girar eterno da roda-mundo. O movimento circular é o pulsar do infinito, estruturado no tempo, no ritmo e na melodia.

Dançar em círculo é trilhar na terra o caminho da luz, feito de sol e de lua, de primaveras, de claridade e escuridão, modelos de Deus que se repetem, profundos, na vida humana.

O ritmo circular das estações existiu em todos os lugares, em todos os tempos, em todos os povos, em todas as danças. De roda.

O primeiro movimento desta dança é dar as mãos. “Dai-me a mão e dançaremos, dai-me a mão e me amarás”, disse o poeta.

As mãos dadas em direção ao solo reafirmam o valor da terra-mãe.

Erguidas, buscam o céu, a ajuda dos deuses.


Braços e corações entrelaçados tornam viva a fraterna união, esperança que desponta no giro da dança. Depois é só repetir os passos, fazendo com que o corpo se torne um recipiente de forças do coração, o centro da experiência.

E as crianças, que estão sempre na vanguarda da cultura humana, sintonizadas com sóis, luas e estrelas, sabem por que cantam ou dançam. Por nada, dirão... mas qual será o homem capaz de alcançar esse nada, que é tudo? Qual será o homem capaz de dançar a própria vida, movimento que surge espontâneo do coração, e constrói a ligação com o Deus-cosmo? Esquecer a própria dança é se perder, é viver como um corpo-zumbi, feito de vontades não sinceras.

Dançar é trazer para a consciência, a vida – a vida verdadeira – canteiro onde existem (e resistem) as sagradas flores da alma. Danças de roda, danças sagradas...

Tempos virão, sem dúvida, em que as pessoas – “todas as pessoas” – darão as mãos e dançarão. Na roda da vida descobrirão que as danças despertam flores! Flores da alma!

Pergunte às crianças...

OBS: Texto escrito por Carlos Solano, Professor de Danças Sagradas


Esse texto, escrito por um professor de Danças Circulares Sagradas, é de uma simplicidade e ao mesmo tempo profundidade tamanhas que somente uma criança podeira ter dimensão exata.

Tenho estudado as danças circulares e utilizado essa movimentação, especialmente nas coreografias folclóricas e o que experimentamos é realmente uma sensação de ludicidade, de alegria, de absoluta leveza.

É incrível como , dainte do círculo, a técnia que outrora amedrontava, simplesmente é compreendida muita mais que coporalmente, mas é sentida, vivenciada.  A roda gira e leva todo e qualquer apego, já disse um dia o poeta...

Então vamos dançar nossas alegrias e tristezas fazendo-as girar e girar e girar...

Olho de Hórus...os olhos e o olhar na dança







Olho de Hórus.




Lua, luz que brilha, irradia,

o amuleto para a visão total,

maquiando na força do universo

sentimentos e intuição real.



Oh! Doce beleza espiritual,

renasça em vôo indestrutível,

mergulhe n’alma, traz a visão,

a virtude e a providência vital.



Das Luas que posso contar, olhar,

embevecido ajoelho em céu azul,

mergulho no raciocínio lógico, fantasias,

vivo a força, a proteção em sua magia.



Egito descerra máscaras para a Lua,

eternamente presente na evolução

mergulhando em sensível elevação

vitória da visão, a busca da proteção.



Osíris e Isis dividem o Deus do Céu.

A embelezar o renascimento d’alma,

Indestrutível em seu poder real,

a cura, olhos no horizonte, mente no infinito.

(Flávia Angelini)
 





 
Dentre os significados deste símbolo e imagem da mitologia egícpia, o olho de Hórus simboliza os ciclos lunares: Hórus, tendo perdido seu olho na Lua nova, é depois reconstituído são e inteiro na Lua cheia. Assim, o Olho Uedjat se torna o sinal da plenitude recuperada, da força, do vigor, da proteção, da segurança, da integridade física e da boa saúde. RUNDLE CLARK, professor de História Antiga da Universidade de Birmingham, explica que o tempo da ausência do olho é a estação do medo e da inércia da vida. Um hino do Império Novo fala da Lua Cheia como o tempo das danças. Através de tudo isso percebe-se o temor do homem antigo pelo escuro e o alívio quando a Lua de novo brilha no céu noturno, ou o ritmo do calendário, da estação morta seguida pelo começo de um novo ano e sobre tudo isto, preside o olho.

Na dança do ventre , a força do olhar e sua utilização cênica é muito ampla.
Olhar por detrás dos véus, as mãos marcando o olhar, o olhar por sobre o ombro, o olhar oblíquo... A própria maquiagem árabe dá um destaque todo especial para o olhar.  A sensação de nos remeter a esse passado longínquo e, ao mesmo tempo, aconchegante. Por isso considero o momento de fazer a maquiagem tão importante. É um momento de meditar, de estar em contato com esse espaço interior ao qual os olhos no espelho nos remetem...

A Arte da Maquiagem e dos cosméticos é bastante ancestral e assim como outras artes ancestrais, possui também seus significados e simbologia próprios.




Nas aulas de Dança do Ventre, seria interessante que todas pudessem entrar em contato com essa prática antes de iniciar a aula.  Os resultados na expressividade e até mesmo motivação das alunas são bastante significativos. Não é preciso muita coisa... lápis preto, sombra cobre, rimel e batom e pronto!

 








Isadora Duncan

Na música há 3 tipos de compositores: primeiro aqueles que na música erudita fazem arranjos e buscam, através de seus cérebros, partituras refinadas e habilidosas que encantam os sentidos através da mente. Em segundo, aqueles que sabem como traduzir suas próprias emoções, tendo a música como meio, em alegrias e tristezas de seus próprios corações, criando uma música que desperta diretamente o coração do ouvinte, trazendo-lhe lágrimas pelas memórias evocadas, pelas lembranças vividas. Em terceiro há aqueles que subconscientemente escutam com suas almas uma melodia de outro mundo e são capazes de expressá-la aos ouvidos humanos compreensivelmente e de uma forma agradável.

Existem igualmente 3 tipos de dançarinos: primeiro aqueles que consideram dançar uma espécie de treinamento físico feito de arabesques impessoais e graciosos, segundo aqueles que, ao concentrar suas mentes, guiam o corpo na direção do ritmo de uma emoção desejada, expressando sentimentos relembrados. E finalmente, há aqueles que convertem o corpo numa fluidez luminosa, rendendo-a a inspiração da alma. Este terceiro tipo de dançarino entende que o corpo, dada sua alma, pode de fato ser convertido num fluido luminoso. A carne torna-se iluminada e transparente assim como é mostrada no raio-x - mas com a diferença de que a alma humana é mais clara que esses raios. Quando a alma, em seu poder divino, possui o corpo, converte-o numa nuvem luminosa em movimento e assim manifesta-se na sua total divindade. Esta é a explicação para o milagre de São Francisco andando sobre o mar. Seu corpo não mais pesado como o nosso, tão leve se transformou através da luz.

Imagine um bailarino que depois de longo estudo, oração e inspiração, tenha alcançado tamanho grau de entendimento, que seu corpo seja simplesmente a luminosa manifestação de sua alma; cujo corpo dança em acordo com a música ouvida interiormente, na expressão de algo vindo de um outro e mais profundo mundo. Este é o verdadeiro bailarino criativo, natural mas não imitativo, falando através de movimentos a partir de si mesmo e a partir de algo maior que todos os seres.

Sinto me tão confiante de que a alma pode ser despertada, possuindo completamente o corpo, que quando trouxe crianças para minha escola almejei acima de tudo fazê-las trazer para si mesmas a consciência deste poder dentro delas, da relação que mantêm com o ritmo universal, evocando o êxtase, a beleza desta realização. O meio para este despertar será em parte a revelação da beleza da natureza e em parte daquele tipo de música que o terceiro grupo de compositores nos dá, que surge da alma e fala para a alma.

Há adultos que esqueceram a linguagem da alma, mas as crianças a entendem. É apenas necessário dizer-lhes: "ouçam a música com suas almas. Agora, enquanto ouvem, vocês sentem um profundo despertar interior, vindo de dentro de vocês? - Que é pela sua força que suas cabeças se erguem, seus braços se levantam e que vocês caminham lentamente na direção da luz?"



Este despertar é o primeiro passo na dança, como eu a entendo.

Quando eu comecei a dançar com os movimentos e gestos que minha alma arrebatada sabia como comunicar ao meu corpo, os outros começaram a me imitar, não entendendo que lhes era necessário voltar a um começo, para achar primeiro algo dentro deles mesmos.

Em muitos teatros e escolas via-se este tipo de dançarino, que compreendiam apenas com o cérebro, que sobrecarregavam de gestos suas danças; seus movimentos pareciam vazios, insípidos e destituídos de significado. O que eles traduziam através da mente parecia totalmente de inspiração e de vida. O mesmo acontece com os sistemas de dança que são apenas ginásticas combinadas, compreendidas apenas logicamente (Daltroze, etc). Parece-me um crime impingir as crianças, que não podem se defender, este treinamento prejudicial; pois é um crime ensinar a criança conduzindo seu corpo em desenvolvimento através do poder rígido do cérebro e ao mesmo tempo enfraquecendo seu impulso e inspiração.

A única força que pode satisfatoriamente conduzir o corpo é a inspiração da alma.

(retirado do livro "Minha Vida" sobre o trabalho de Isadora Duncan)

domingo, 8 de agosto de 2010

Texto narrado por Lulu Sabongi em seu vídeo - A Arte da Dança do Ventre

Dando sequência aos materiais poéticos dentro da didática da Dança do Ventre, eis um texto e um poema   belíssimos!

Esse material  faz parte  do primeiro vídeo didático lançado pela professora e bailarina Lulu Sabongi, no início da década de 90, no Brasil. No vídeo, podemos ouvir estas palavras que resolvi digitar por acreditar que devem ser relembradas sempre, na voz da própria Lulu. Todas que estudam a Dança deveriam ter este material para ouvir, mostrar pras alunas, manter a conexão como o feminino arquetípico.



A Arte da Dança do Ventre

O ventre é o símbolo da matriz original, da mãe. Assim como a caverna, a imagem do ventre inspira proteção e calor materno. É no ventre que se assentam os órgãos das funções gástricas que produzem a digestão dos alimentos e, por esta localização, ele é comparado ao laboratório alquímico. Os alquimistas diziam que é preciso alimentar o filho filosófico do ventre de sua mãe. O calor do ventre facilita as transformações mas é preciso que tenha para cada um, e a cada momento de sua evolução, o grau e a intensidade adequados.

A presença do ventre na Dança pode ser notada através dos séculos na Arte, na Literatura e na Mitologia, nas esculturas e em pinturas de cavernas pré-históricas, o testemunho mútuo da existência da importância do ventre no Mundo Antigo.

Em diversos locais do Mundo e principalmente no Círculo Mediterrâneo são encontradas manifestações perpetuadas pela Arte que demonstram a importância do movimento da região ventral e da região pélvica nas danças que cultuavam a fertilidade.


...Um som agudo cinge e circula pela sala.
Com gestos impetuosos, ela sai de sua imobilidade
e repentinamente todo o seu corpo treme acompanhando a música.
Suas mãos estão levantadas tangindo os snujs e ela suavemente gira sob si mesma
fazendo de sua perna direita o pivô, convulsionando maravilhosamente
todos os músculos de seu corpo.
Após ela completar o círculo, ela pára e avança suavemente.
Todos os seus músculos tremem em compasso com a música em sólido e substancial espasmo.
Ela movia uma perna após a outra, como fazem as ciganas em suas danças,
tornando o movimento voluptuoso.
Parando inesperadamente, ela mantinha toda a sua musculatura em movimento.
Caindo sobre seus joelhos, ela contorcia o seu corpo, braços e cabeça girando
acima do chão, ainda com gestos que tangiam os snujs.
Da mesma maneira, isto era profundamente dramático,uma poesia lírica que
palavras não podem descrever: profundo, oriental, extenso e terrível.

(Descrição do jornalista americano Kurts, séc XIX, durante uma viagem de 15 milhas pelo Rio Nilo)

Durante muito tempo e principalmente nos últimos 150 anos, a conceituação da Dança do Ventre sofreu uma metamorfose. Ligada aos espetáculos de variedades, ela quase se desvinculou de seu caráter sagrado.
De origem múltipla, desde a orla do mediterrâneo até os pontos mais extremos do Oriente Médio, aos limites da Índia, a Dança do Ventre surgiu vinculada sempre aos atributos femininos de sedução, fertilidade e espiritualidade. Ela já estava presente nos antigos rituais egípcios e como toda dança ela tem o sentido maior da celebração.

A Dança do Ventre é realmente a celebração da vida.

Nós dançamos como que para afirmar a vida.
Por muito tempo, o binômioforça e vida foi celebrado assim, respeitando os ciclos naturais, especialmente a chegada da Primavera e o renascer das forças da Natureza. Desta forma venerada, em todas as suas manifestações, vegetal, animal, imagens cósmicas do sol e da lua, o binômio força e vida trnasformou-se em Mito, criados assim para explicar os fenômenos naturais.

Devido sua origem desconhecida, a Dança do Ventre que conhecemos hoje provém de um passado remoto e foi possivelmente transmitida por povos nômades que margeavam o Norte da África e os confins da Ásia, ciganos que levavam sua cultura atravésdassuas necessidades de manutenção.

Em cada região que paravam para comercializar suas produções, quer animal ou artesanal, sempre acabavam agregando à sua cultura algum elemento local e também la deixavam, bem denunciada, a sua passagem. É por isso que muitas danças, de diversas regiões do Oriente, com nomes específicos, são muito semelhantes à Dança do Ventre que conhecemos hoje. Na Grécia, ela é conhecida como chiftitelly,   no Egito raqs sharqī(رقص شرقي

O mundo ocidental também teve as suas "danças do ventre" mas infelizmente isso hoje é uma tradição perdida por culpa da religiosidade católica e sua excessiva observância sobre a lacívia do corpo em movimento.

Podemos concluir que , com a explosão da Dança do Ventre na atualidade, a mulher traz de volta a figura do feminino erótico que durante muito tempo ficou soterrado pela incapacidade masculina em lidar com o mundo integrado também pelo amor e não apenas pelo excesso de poder.

O quadril é a força motriz da Dança do Ventre. E é nessa região onde nascem os movimentos e para onde eles retornam.  (Lulu Sabongi)


E pra finalizar, um detalhe dotexto da contra capa do video...tudo perfeito, até nos detalhes:


Dança do Ventre – O Resgate do Feminino Arquetípico




Segundo Carl Gustav Jung, um dos nossos deveres primordiais é reconciliar o civilizado e o primitivo que existem em nós e redescobrir esta intensidade de viver, desaparecida, que ainda é encontrada nos rituais e nos festivais de Dança e de Música.

A tradição da Dança Árabe que aceita o corpo qualquer que seja sua forma e aceita a afirmação da sensualidade da mulher, qualquer que seja a sua idade, permite à mulher revalorizar a imagem que tem de si mesma.

“Nós dançamos como que para afirmar a vida. E como base de toda dança tem o sentido maior da celebração, a Dança do Ventre é realmente a celebração da vida.”

(texto extraído da contra capa do vídeo didático de Lulu Sabongi – A Arte da Dança do Ventre)